Vou ser pontual. Ou não.

A mente tem esta capacidade brilhante de interpretar a realidade à sua maneira, por forma a criar um falso estado de tranquilidade.

Observo como algumas pessoas me dizem, sem qualquer desconforto, que estão a seguir o meu conselho, porque é a realidade. E então dizem coisas como “prometo chegar a horas. Ou não.” e “Eu vou jantar contigo. Ou não.” e “Eu termino este projecto até quinta-feira. Ou não.”

E depois não cumprem e, aparentemente, é perfeitamente ok, porque tinham avisado que poderiam não cumprir.

Chamo a isto manter-se num estado de negação da realidade.

Quando me comprometo a algo e afirmo que há uma possibilidade de não cumprir não estou a dizer que posso ter um ataque de preguiça, ou que de repente surgiu algo melhor. Não podia estar mais longe da doce realidade!

O que eu quero dizer é muito mais simples. Eu prometo ir à tua festa de anos. Ou não. Este “ou não” significa apenas que a Vida pode ter outros planos para mim. Ser atropelado por um camião, por exemplo. Ou um amigo ou familiar ser hospitalizado. Ou ter um enfarte que me atira para um hospital (ou cemitério). É isto o que significa “ou não”.

Mas jamais me ocorreria comprometer-me a fazer algo e mais tarde mudar de ideia e fazer outra coisa, ou comprometer-me com outra pessoa. Isto é viver em estado de negação (para não falar em oportunismo).

A pessoa que se compromete comigo a um encontro, por exemplo, e depois não aparece é a pessoa perfeita para a próxima vez que eu quiser marcar um encontro com alguém que não aparece. Não fico magoado nem triste. Rapidamente sei que a Vida tem outros planos para mim. Mas não volto a contar com essa pessoa. Ela é a pessoa que não cumpre.

Claro que se esta pessoa não cumpre por motivos de força maior, eu compreendo. Não vejo porque motivo não haveria de compreender.

Por outro lado, presto sempre atenção ás desculpas e justificações dadas. Gosto da realidade. Basta dizer “o meu pai está mal.” Eu compreendo. Não há necessidade de prosseguir com aquelas histórias que dizem “quero que penses de mim o que eu mesmo não sou capaz de pensar de mim.”

Observa-te de cada vez que estiveres a justificar-te. Descobre onde estás a mentir. Eu sei que estás. Se estivesses a ser sincero não te justificavas, não precisarias que outros pensassem de ti o que quer que seja.

Somos educados a pensar que é falta de educação faltar a um compromisso e depois não nos justificarmos. A falta de educação pode ser o faltar ao compromisso porque surgiu algo melhor. Mas não é a justificação que irá remediar essa falta. Desiste de te justificares. E quando tiveres mesmo a necessidade de te justificar, sê breve.

A justificação, na grande maioria das vezes, é uma forma de manipular os outros. Por detrás da justificação há a necessidade de mostrar que somos pessoas boas. Se somos pessoas boas porque motivo haveríamos de necessitar de uma justificação?

Recordo-me das palavras do Yoda (Guerra das Estrelas): “Ou fazes ou não fazes, não há tentar.”

Quantas pessoas se refugiam em desculpas como estas:

“Não sou capaz.”

“Não tenho tempo.”

“Eu tentei mas...”

“Não sei o que acontece, mas vou deixando as coisas por fazer...”

“Eu podia fazer melhor, mas...”

Estas desculpas são mesmo e irremediavelmente os pregos com que construímos uma casa de falhanços.

Se estiveres num processo de acordar irás observar o seguinte:

- Consegues ouvir uma voz suave que te diz o que é para fazer a seguir;

- Não tentas “destruir” o ego (querer destruir uma ilusão é acreditar que é real);

- Raramente, ou nunca, precisas de te desculpar;

- As pessoas à tua volta sentem-se bem;

- Os outros sabem que estás presente e consegues ouvir de verdade;

- Não tentas manipular ninguém (nem mesmo os filhos);

- Ninguém te consegue magoar;

- Respeitas-te continuamente e observas que ninguém te falta ao respeito;

- Não dependes das opiniões dos outros sobre o que fazes ou dizes;

- A imperturbabilidade é o teu estado natural ao longo do dia;

- Não tentas “desapegar-te” das coisas e pessoas. O tentar o desapego é uma das actividades favoritas de um ego espiritualizado. Em vez disso, desfrutas de cada coisa e pessoa no momento, sem qualquer expectativa nem receio;

- Não impinges a tua filosofia a quem quer que seja. Eu, por exemplo, que me considero a começar a levantar um nadinha as pálpebras, sei que ninguém tem que seguir a minha filosofia nem sequer tem que fazer um curso meu ou ler o que quer que seja de minha autoria. A única coisa que espero de qualquer pessoa é que seja quem ela é;

- Quando estás com alguém, seja quem for, entregas-te completamente a essa pessoa. Só ela existe;

- Observas, observas, observas. Sem necessidade de comentar o que quer que seja. Excepto se te for pedido um comentário. E mesmo assim, estarás perfeitamente tranquilo para o não fazer;

- Consegues ver perfeição em tudo;

- Deixas de ditar como as coisas deveriam ser;

- Sentimentos de ódio, revolta, ansiedade, angústia, tristeza, são situações que ultrapassas em minutos.

Claro que posso estar completamente errado. Mas para mim funciona. Para ti? Descobre o que te faz sentir bem e sem necessidade de te desculpares.

A outra forma deliciosa de manipular os outros é fazer-lhes uma pergunta e quando não gostamos da resposta insistimos na pergunta. Seria mais íntegro fazer a pergunta e informar os outros de qual a resposta que esperamos ouvir.

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