Ciência e Pseudociência

As redes sociais trouxeram consigo alguns benefícios, sobretudo no que toca a partilha de informação. Contudo esta partilha de informação significa que literalmente tudo é partilhado, desde a descoberta de um novo exoplaneta pela NASA até às teorias de conspiração do Manel dos Limões que passa os dias a fumar uns charros e a insultar qualquer ser humano que discorde das suas teorias.


Por este motivo explico a diferença entre o que é a ciência e o que o Manel dos Limões faz quando não está a fumar um charro (eu sei, estou a generalizar, há pessoal com habilitações académicas que cai facilmente no logro da pseudociência).


A Ciência procura a crítica, é através da crítica dos pares (outros cientistas) que pode evoluir. A Pseudociência odeia a crítica, transformando em inimigo qualquer pessoa que ouse duvidar do que é dito.


A Ciência usa um vocabulário próprio, claro, sem possibilidade de segundas interpretações. A Pseudociência prefere o calão, e palavras que confundam e possam ser interpretadas de várias maneiras.


A Ciência declara uma descoberta depois de muito estudo, análise de dados, e anos de investigação. A Pseudociência gosta da grandiosidade das suas descobertas, sem qualquer base  credível, porque alguém disse logo tem que ser verdade.


A Ciência segue um rumo através de evidências, coloca-se questões e procura respostas. A Pseudociência dá primeiro as respostas e depois procura a evidência que demonstre que a resposta está correcta.


A Ciência tem em conta todos os dados e argumentos, experimenta e assume erros. A Pseudociência procura apenas os dados que suportem as suas teorias, descartando qualquer facto desfavorável às mesmas. 


A Ciência recorre a métodos de investigação rigorosos e promove a repetição desses métodos por cientistas em qualquer parte do mundo. A Pseudociência não possui método, não permite a repetição de um teste e exige que se acredite no que é dito sem considerar qualquer argumento ou análise.


A Ciência baseia-se na revisão por pares de qualquer resultado, outros cientistas irão analisar o que é descoberto e verificarão a veracidade do mesmo. Há um mundo de competitividade onde um cientista sobretudo irá verificar a veracidade do que é descoberto por outro cientista. A Pseudociência é feita por indivíduos que regra geral trabalham por conta própria, assumem estar certos e não permitem que outros critiquem ou investiguem as suas descobertas assombrosas.


A Ciência é criada a partir de um raciocínio lógico e cuidadoso, há toda uma sequência de eventos estudados e elaborados pelo cientista por forma a não permitir a subjectividade. A Pseudociência recorre a teorias inconsistentes e contraditórias, muitas vezes carentes de qualquer lógica e sem fundamento.


A Ciência muda. O que ontem era verdade, hoje é duvidado e amanhã é falso. A Ciência evolui, assume erros e muda de acordo com novos dados que vão surgindo. A Pseudociência é sobretudo dogmática, como a religião. Obriga os seus seguidores a acreditar no que é dito sem questionar. É imutável. Se era verdade para o Homem de Neandarthal, também é verdade hoje. 


Hoje em dia vivemos inundados por informação pseudocientífica. Muitas pessoas pegam num parágrafo que leram no Facebook, mais umas linhas no Twitter, mais o que está escrito no livro do Génesis e elaboram uma teoria que acreditam ser à prova de qualquer análise ou crítica independente. 


Quando te chegar informação acerca do que quer que seja, ser-te-à relativamente fácil verificar a sua veracidade. Alguns dos erros mais comuns na pseudociência:


  • Não há indicação de um estudo específico efectuado (há uma diferença entre afirmar “O ensaio na Jonhs Hopkins que envolveu 12 mil participantes - link para o ensaio aqui”, e “um estudo mostrou que 67% das pessoas morreram”);
  • Erros ortográficos. Embora cientistas estejam mais interessados nas suas investigações do que na ortografia e gramática, eles sabem que um artigo para ser publicado não pode conter erros;
  • Afirmações generalizadas e sem apontarem estudos concretos (nota a diferença entre “Segundo um estudo da Oxfam efectuado no Uganda e Quénia, e que envolveu 65 mil participantes, 97% das pessoas não sobrevivem ao Ébola - link para o estudo aqui” e a afirmação “Depois de visitar o Uganda e Quénia sei que as mortes provocadas pelo Ébola são muito menos do que os media afirmam”);
  • Artigos científicos fazem referência ao cientista, ou cientistas, envolvido assim como o laboratório, técnicas utilizadas, dados demográficos, métodos, enquanto que o pseudocientista refere-se a si mesmo como autor inquestionável das suas descobertas, sem qualquer apresentação de dados verificáveis por terceiros;
  • Generalizações, são por norma o campo da pseudociência. A Ciência gosta de números factuais, vive o sadomasoquismo da bio-estatística. Já a Pseudociência atira com números ao ar. Um exemplo disto é a percentagem de mortes causadas pelo covid19. O valor estatístico tem sofrido alterações praticamente todas as semanas, porque cientistas continuamente analisam dados e procuram respostas. A Pseudociência desde o início da pandemia que não altera esta percentagem (indo de 0,9% a 1,7%);
  • Sim, há médicos a falar abertamente de ciência, regra geral são aqueles que não fazem ciência nem lidam diariamente com o drama de perder uma vida ou sentir a impotência de não poder ajudar quem sofre.


Resumindo e simplificando este artigo, quando te bater à porta um artigo científico verifica apenas se nesse artigo há indicações específicas acerca dos estudos feitos, onde foram feitos, como foram feitos, e quem os fez. O artigo que faz afirmações sem apresentação de dados verificáveis é invariavelmente pseudociência (gostaram da minha generalização? Podem acreditar, levo anos a generalizar, sou perito nisto).

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