Aprendemos muito cedo que há algo
de errado connosco. Quando a criança tem um comportamento que não é aprovado
pela família irá ter a experiência da vergonha ou culpa, a experiência de que
há algo de intrinsecamente errado consigo. Isto acontece porque não sabemos
distinguir a acção do sujeito. Julgamos a criança em vez do comportamento. A
criança não é mal-educada quando faz birra, fazer birra é que pode afastar os
outros.
Devido a este processo de
domesticação aprendemos que há comportamentos e emoções que são maus. É mau
estar triste, é mau chorar, é mau gritar, é mau ficar zangado. Aprendemos a
importância de estar bem. Estar feliz. Dizer sim aos mais velhos. Obedecer
mesmo que esta obediência signifique desobediência à nossa natureza.
Observem o carinho com que um
adulto faz uma criança sentir-se mal por não sorrir ou não querer dar um beijo
à tia ou não lhe apetecer comer a sopa toda. É o carinho que diz “se não
fizeres como eu quero irei retirar o meu amor por ti”. E assim aprendemos a
necessitar do amor dos outros para estar bem.
O preço desta aprendizagem é
muito elevado. Iremos fazer coisas para agradar aos outros, iremos dizer sim
quando queremos dizer não, iremos lutar contra a nossa própria natureza.
Para algumas crianças esta
experiência inicial de negação da sua natureza é tão forte que decidem nunca
crescer. Tornam-se adultos carentes. Em vez de serem adultos que aprovam e amam
crianças, tornam-se adultos em busca da aprovação e amor dos outros.
Há uma forma de crescer, de amadurecer.
Chama-se silêncio. Observar-me em silêncio. Neste silêncio poderei descobrir o
quanto exijo dos outros e o quanto luto com tudo o que acontece se não for do
meu agrado.
Aprendemos que para estar bem
precisamos de ter coisas. Precisamos de um carro, de uma casa, de roupa da
moda, do último modelo de telemóvel, de namorado/a, de filhos (de preferência
bem educados e saudáveis – ninguém quer um filho mal-educado ou doente),
precisamos de dias de sol, de férias no verão, de amigos que nos compreendam.
Um constante “eu, eu, eu, eu”. Um inferno.
E como não é possível ter tudo o
que queremos, amuamos. Ficamos tristes e fechamo-nos porque a vida, ou a
esposa, ou os pais, não nos dá aquilo que queremos e acreditamos precisar.
Surgem as depressões (não gosto
da vida como está a acontecer) e as ansiedades (não irei gostar da vida que
acredito irá acontecer). Se apenas soubéssemos que a tristeza é um sentimento
nobre, que nos convida a olhar para dentro. Mas como fomos ensinados que estar
triste é mau, sempre que este sentimento visita tentamos eliminá-lo. Vamos às
compras, visitamos um amigo, vemos televisão. Ou ficamos na cama a pensar em
tudo o que está errado nas nossas vidas.
É bom ter planos, é bom desejar
algo. Mas sem o apego a que a vida aconteça de acordo com os nossos planos.
Aprender a querer aquilo que está
a acontecer é a chave para estar bem. E isto não significa uma atitude passiva
de forçar-me a acreditar que está tudo bem. Se alguém grita e vomita insultos,
é isso que eu quero (porque é o que está a acontecer) e observo como este corpo
se movimenta na direcção oposta desta pessoa. Se uma mágoa surge, é esta a emoção
a que eu dou as boas-vindas. Recolho-me em mim. Dou-me atenção a mim. Sei que
as pessoas não têm o poder de me magoar, apenas aquilo que eu penso acerca das
pessoas pode magoar-me.
Querer o amor de outro é uma
forma requintada de sofrer quando este amor não é correspondido. Se amo outro
posso ficar bem na presença dos sentimentos que esse amor desperta. Mas se
acreditar que preciso que este amor seja correspondido irei perder esta experiência
de amor que nasce em mim e passarei a sofrer porque o amor que sinto não é retribuído.
Se para me sentir bem a amar outro ser humano precisar que esse outro me ame de
volta, isso não é amor: é carência afectiva.
Sabe bem amar outros sem
necessitar de ser amado de volta. É a liberdade total.
Quando nada quero, tenho tudo.
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