Observo
com cada pessoa que surge no meu gabinete que a primeira coisa em que foco a
atenção é a sua capacidade de ouvir. Numa escala de um a dez, em que um é a
capacidade de ouvir de um recém-nascido e 10 é um buda, a maioria das pessoas
encontra-se num um ou dois.
Para
ouvir outros é necessário ter em conta alguns pontos.
Primeiro,
saber que o que o outro diz é a sua experiência pessoal. Não temos que fazer
nada com essa experiência. Nada! Mesmo! O mundo não vai acabar nem iremos
perder um membro por ficarmos calados.
Segundo,
saber que não temos que nos defender do que quer que seja que o outro diz. Mais
uma vez, o mundo não vai acabar nem nos vão arrancar a cabeça por não nos
defendermos.
Terceiro,
saber que o outro está unicamente a partilhar as suas experiências,
independentemente de serem positivas ou negativas. E sim, o mundo não acaba por
ficarmos calados.
Quarto,
saber que partilha é mesmo isso: ouvir o outro sabendo que não temos que fazer
nada com a informação. É uma partilha apenas.
Há
certas expressões que uso com muita frequência quando ouço outros.
“Estou
a ouvir-te.”
“Compreendo
o que estás a dizer.”
“Conta-me
mais, não estou a compreender.”
“Ok.”
“És
capaz de ter razão, e a minha experiência é diferente da tua.”
“Permites
que te diga como eu vejo as coisas?”
Outro
aspecto importante de ouvir os outros é criar um espaço de silêncio entre
aquilo que o outro diz e a minha resposta. Dar-me tempo para processar o que
foi dito. Um exemplo. Há algum tempo uma cliente dizia-me que não confiava no
meu trabalho. Ouvi-a. Ela não confiava no que eu estava a fazer. No silêncio
criado a seguir a este comentário surgiram pensamentos como estes:
“Será
que ela tem razão?”, “Serei eu capaz de confiar no meu trabalho?”, “O que
significa isto de não confiar no meu trabalho?”. O que fui observando é que
esta cliente tinha toda a razão em não confiar no meu trabalho. Eu não mando
nem controlo a vida. Faço o que sou capaz. E no processo de cura há tantos factores
envolvidos que jamais seria capaz de os controlar ou eliminar ou acrescentar.
Em realidade o meu trabalho limitava-se a mexer em pontos específicos dos pés,
como me foi ensinado. Se este mexer em pontos iria trazer os resultados
esperados ou não ultrapassava-me. Descobri ainda que eu também não confiava no
meu trabalho. Por vezes os resultados são os esperados, e por vezes não são.
Descobri que eu e esta cliente estávamos em concordância. E a minha resposta,
que surgiu do silêncio criado, foi simplesmente, “sabe, por vezes eu também não
confio no meu trabalho, e adoro quando as pessoas concordam comigo, bem-haja.”
Isto não foi dito em tom sarcástico nem cínico. Foi apenas uma constatação.
Muitos
conflitos entre nós surgem ainda do facto de não sabermos estar calados. Antes
de abrir a boca para dizer o que quer que seja, questiono-me acerca do que vou
dizer. As duas perguntas que me coloco são estas:
- O
que vou dizer é útil a esta pessoa?
- O
que vou dizer acrescenta bondade à vida desta pessoa?
Noto
que também uso com muita frequência a expressão “Permites que te diga o que
penso acerca disto?” ou “Posso falar-te da minha experiência?” – e se a
resposta for um não, respeito-a e mantenho o silêncio.
Outro
aspecto importante acerca da comunicação é saber quando falar. Não falo se a
outra pessoa estiver alterada, se estiver nervosa ou irritada. Sei, pela minha
experiência pessoal, que quando estamos num estado alterado não conseguimos
mesmo ouvir os outros. Nestas situações limito-me a concordar com o que quer
que seja que a outra pessoa trás para partilhar.
Um
exercício que considero belíssimo é este: passa um dia inteiro a perguntar-te,
antes de falar, se o que vais dizer é uma informação útil ao outro ou se
acrescenta bondade. Irás experienciar muitos momentos de silêncio. E se o
silêncio te incomodar, pergunta-te “o que quero que esta pessoa pense acerca de
mim?”. É que muito, muito mesmo, daquilo que dizemos é para manipular o que os
outros pensam acerca de nós. Fica atento, observa-te.
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