O que acontece aos filhos de um pai/mãe narcisista?

A criança que cresce num ambiente em que o pai ou mãe é narcisista irá tornar-se num adulto com deficiências emocionais acentuadas e difíceis de reparar sem a ajuda de um profissional. Toda uma infância e adolescência a mendigar migalhas de afecto, atenção, cuidados com um preço oculto, tornam o adulto uma presa fácil a muitos tipos de predadores, sobretudo porque a sua tolerância aos comportamentos egoístas dos outros é muito acima da média. Um exemplo disto é o adulto cuja namorada ignora os seus sentimentos poderá tolerar esta atitude durante não mais que dois ou três meses, o adulto filho de um pai/mãe narcisista inicialmente sentirá que talvez a culpa seja sua e irá questionar-se repetidas vezes até que ao fim de dez ou doze anos a ser emocionalmente ignorado ponderar terminar a relação.

  1. Tendências para o perfeccionismo. Crianças de um pai/mãe narcisista crescem a acreditar que nunca são suficientemente boas. O resultado desta crença leva-as a perseguir para si mesmas um ideal de ser humano impossível: a perfeição. Muitas vezes, apesar dos elogios de colegas e amigos acerca de um trabalho bem feito, sentem-se uma fraude, não acreditam nos elogios e sabem, no seu íntimo, que poderiam ter feito melhor.
  2. Necessidade de agradar a todos. Um pai/mãe narcisista mantêm-se sempre no centro das atenções, é tudo acerca deles, controlando tudo e todos para atingir os seus fins. Por este motivo a filha/o cresce a acreditar que a perfeição envolve certificar-se que toda a gente à sua volta é feliz, mesmo que isso implique ceder em qualquer situação, não ter voz, culpar-se pelo que quer que seja ou esquecer a sua vida. É quase impossível romper o hábito de crescer a tentar continuamente agradar ao pai/mãe narcisista por forma a conseguir um ambiente calmo em casa. Só com a ajuda de alguém em quem confia e depois de alguns anos, é que o adulto consegue abrir mão da necessidade de agradar a todos.
  3. Carente em qualquer relacionamento. Este aspecto é um resultado do anterior. Por forma a conseguir umas migalhas de afecto ou atenção do progenitor narcisista, a criança tem que ir ao encontro das necessidades do adulto. À medida que cresce aprende que é incapaz de autonomia e poder de decisão, estando cada ação dependente da aprovação do pai/mãe. Nos relacionamentos irá aguardar esta aprovação do parceiro/a continuamente. O receio de assumir uma posição contrária à do parceiro/a é aterradora.
  4. Necessidade constante de aprovação e validação externa. Um sentimento do nosso valor é algo intrínseco, sabemos avaliar-nos mais ou menos de acordo com os nossos feitos e interações com outros. A criança de um pai/mãe narcisista cresce num ambiente em que tudo o que faz é continuamente desvalorizado, ignorado, ou elogiado se o mérito pertencer ao pai/mãe. Desde uma boa nota na escola até ganhar a corrida de S. Silvestre, não fora a ajuda do progenitor jamais teria conseguido o feito.
  5. Tem direitos. Enquanto que a necessidade de validação do adulto que cresce sob a influência de um pai/mãe narcisista é compreensível, esta atitude pode evoluir para um sentimento de ter direito a tudo só porque sim.  Aqui a pessoa adulta sente que merece elogios por tudo o que faz ou diz. Pode ser incapaz de diferenciar uma nota aguda de uma grave mas quando canta exige que os outros elogiem os seus dotes vocais. Este comportamento é motivado por uma necessidade na infância de receber a atenção e afecto do progenitor. Não sabe quem é nem como ser vulnerável ou pedir aquilo que realmente quer, porque nunca aprendeu. 
  6. Completamente focado na sua imagem externa. Esta tendência é tão intensa que para o adulto não importa assim tanto o que está a acontecer como a imagem que os outros estão a construir acerca de si. O desconforto de se mostrar tal como é (muitas vezes acompanhado de um sentimento de inutilidade ou produto danificado) leva o filho/a adulto/a de um pai/mãe narcisista a investir toda a sua energia na imagem. Qualquer crítica a esta imagem pública é uma experiência avassaladora que será recebida com raiva ou desespero e angústia.
  7. Baixa auto-estima. É habitual um pai/mãe narcisista recorrer à manipulação psicológica (gaslight) assim com invalidar as experiências e emoções da criança como forma de criar no filho/a um sentimento de inferioridade, submissão e culpa. Com o decorrer dos anos esta abordagem irá criar uma baixa auto-estima.
  8. Arrogância. Embora pareça contraditório a uma baixa auto-estima, a arrogância serve como escudo ou proteção por forma a evitar mais sofrimento emocional. O pai/mãe narcisista cria uma ilusão de o seu filho/a de alguma forma ser especial em relação a outras crianças (afinal é responsável pela vida emocional do pai/mãe), e a única forma de manter este status é através de uma negação dos seus verdadeiros sentimentos e valores.
  9. Dificuldade em estabelecer limites saudáveis. Um pai/mãe narcisista não tem qualquer respeito pela privacidade do filho/a, não reconhece qualquer limite na vida privada da criança. O resultado é um filho, quando adulto, não saber respeitar-se, em que situações, com quem nem de que forma. Aprendemos a estabelecer limites com outros através dos exemplos dos pais ou sendo ensinados por adultos que reconhecemos como responsáveis pela nossa vida. 
  10. Extremamente competitivo. A necessidade de ganhar em tudo, seja uma discussão sobre as plantações de bananeiras na Costa Rica, onde ir jantar ou preparar a melhor ceia de natal, para o filho/a de um pai/mãe narcisista há sempre a necessidade de vencer, ganhar, ficar por cima. Esta natureza competitiva, desfasada da realidade, deve-se à necessidade, em criança, de ser vista e apreciada pelo progenitor. 
  11. Necessidade contínua de atenção. A necessidade constante de atenção deve-se à ausência quase completa de atenção do progenitor narcisista na infância. Este atributo irá criar adultos ciumentos, desconfiados, com dificuldade em relaxar num relacionamento amoroso. Exigem do parceiro atenção constante. Têm necessidade de saber sempre onde o parceiro/a está, com quem, a fazer o quê. E mesmo que seja informado, raramente irá acreditar.
  12. Desconforto nos elogios. É uma das ironias de adultos cujos pais são narcisistas. Por um lado são extremamente competitivos e buscam a atenção constante dos outros, por outro sentem-se desconfortáveis com um elogio. Este desconforto tem origem nas mil e uma maneiras do progenitor minar qualquer feito merecedor de um elogio ou reconhecimento.
  13. Incapacidade de gerir as suas emoções. Aprendemos a reconhecer e gerir as nossas emoções na infância, sobretudo na presença de um pai/mãe atento, cuidadoso e afectuoso. O filho/a de um pai/mãe narcisista não recebe qualquer orientação quando surgem em si emoções intensas como a raiva, desespero, sentimento de injustiça, etc. A criança não sabe o que fazer com estas emoções a não ser escondê-las por forma a evitar a ira do pai/mãe.
  14. Sentimentos de vergonha e culpa constantes. Devido à educação tóxica da infância, o adulto filho/a de um pai/mãe narcisista vive continuamente num estado de confusão mental, emocionalmente saltando entre a culpa e vergonha. Precisa de ter a certeza de reagir de forma apropriada a qualquer situação, e em realidade não sabe sequer que muitas vezes não há uma reação apropriada específica. Este adulto diz a si mesmo com frequência que tem que saber como lidar com o chefe ou a esposa ou o vizinho em situações de tensão. E não sabe.
  15. Atitude de vítima. Um pai/mãe narcisista vive num estado constante em que não é amado, compreendido, qualquer problema é culpa de outros, todos os seus esforços passam despercebidos, ninguém reconhece o seu valor. Toda a gente lhe quer mal, e assim trata mal o filho/a. O filho/a, chegado à idade adulta, irá modelar este comportamento, embora a partir de um estado de confusão mental porque no fundo compreende que há algo de errado com o seu comportamento.

Resumidamente:

  1. Baixa auto-estima ou desvalorização como ser humano;
  2. Sentimentos crónicos de culpa e vergonha;
  3. Extremamente sensível a críticas ou rejeição;
  4. Carente, continuamente a tentar “ganhar” amor e validação;
  5. Depressão ou ansiedade sem uma causa específica;
  6. Dificuldade em estabelecer limites saudáveis;
  7. Incapacidade de gerir emoções;
  8. Competitividade (para conquistar a aprovação e valorização externas);
  9. Sentimento de não merecer;
  10. Comportamentos auto-destrutivos;
  11. Ciúme tóxico num relacionamento;
  12. Convence-se de ser inútil, inferior, produto danificado.

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