Como lidar com pessoas tóxicas, incluindo familiares próximos

 Há pessoas difíceis, complicadas, tóxicas. Todos nós por vezes temos momentos em que somos assim, difíceis e complicados. Ou porque dormimos mal, estamos com fome ou sede, cansados. E depois há pessoas que se mantêm nesse registro de manhã à noite. Estes últimos são efectivamente pessoas tóxicas. A forma como podemos gerir uma relação com alguém que seja tóxico depende da relação em si, pai, mãe, irmão, colega de trabalho ou chefe, se quisermos manter a nossa sanidade mental e emocional.


No caso de a pessoa tóxica ser alguém com quem tenhamos começado uma relação, seja de amizade ou amorosa, a atitude mais correcta será afastarmo-nos dessa pessoa definitivamente. Se a pessoa tóxica for um pai ou sogra, a possibilidade de nos afastarmos da pessoa é reduzida, embora haja formas de salvaguardarmos a nossa integridade e estabelecer limites pessoais saudáveis.

Alguns dos comportamentos tóxicos facilmente identificáveis num familiar incluem:


  • Reações muito negativas. Estas pessoas não conseguem controlar as suas emoções quando alguém as responsabiliza por algo que corre mal ou causa mal-estar a terceiros. É habitual estas pessoas exagerarem na reação a situações do dia-a-dia em que se sintam ignoradas ou desrespeitadas (mesmo que o não sejam). Qualquer pessoa que não concorde com as suas opiniões será atacada de uma forma agressiva, abusiva ou mesmo destrutiva. Se é suposto chegar a casa dos pais para o jantar semanal às 19 horas e, devido a um imprevisto, o filho e a sua esposa chegam meia hora atrasados é suficiente para o pai tóxico acusar de falta de respeito, ou que já não tem apetite, ou até diminuir o filho ou nora com insultos, num tom de voz acima do habitual. Por detrás desta reação há um sentimento de perda de controle;
  • Ausência de empatia. A pessoa tóxica não consegue compreender a dor dos outros. Na verdade, tudo o que acontece é transformado num drama acerca deles e das suas necessidades. Se a filha de uma mãe que ocupa um alto cargo numa empresa começa a namorar com alguém desempregado, por exemplo, é capaz de ficar “deprimida” porque não sabe onde errou na educação da filha. Estas pessoas não conseguem ver no seu comportamento tóxico a forma como afectam os outros nem como magoam as pessoas que dizem amar;
  • Extremamente controladores. Quanto mais tóxica for a pessoa, maior a necessidade de controlar tudo e todos. Isto implica ver os filhos adultos como sendo ainda crianças, reprovando decisões de outros só porque não foram consultados, acusar um familiar de mentiroso ou até ameaçar um afastamento definitivo. Exigem que os filhos, por exemplo, informem sempre onde estão, com quem e a fazer o quê. São capazes desde muito cedo incutir na criança um medo irracional da vida e do mundo, o qual alimentam até ao fim dos seus dias;
  • Extremamente críticos. A pessoa tóxica é incapaz de reconhecer qualquer mérito no filho ou esposa. A criança premiada como a melhor da escola receberá de um pai tóxico uma reação como “se não fossem as minhas explicações…” ou “Tens a certeza que ficaste em primeiro lugar? Custa-me a acreditar.” Num ambiente familiar preferem conversas acerca de pessoas que não estão presentes e que sejam difamatórias ou negativas. Deitam abaixo os outros para se sentirem superiores;
  • Culpabilizam todos excepto eles mesmos. Qualquer situação que dê origem a um mau ambiente, desentendimentos, hostilidades e até ruptura entre membros da família será sempre culpa de outros. Normalmente o elemento da família que consideram mais frágil ou vulnerável. Este tipo de pessoa nunca assume responsabilidade por qualquer problema, optando por distorcer factos e manipular opiniões por forma a nunca terem que pedir desculpa;
  • Tensão permanente em interações sociais. Para os restantes membros da família a experiência de estar com uma pessoa tóxica é de continua tensão porque ninguém sabe quando irá ter lugar a próxima birra. À sua volta é fácil notar como os restantes membros da família tentam agradar e nunca discordar com a pessoa tóxica.


O passo mais importante para os filhos já adultos de pais tóxicos é saberem que jamais conseguirão mudar o comportamento dos progenitores, podem sim aprender a responder em vez de reagir a esses comportamentos. A pessoa tóxica provoca mal-estar nos outros com um objectivo em mente: obter uma dose de dopamina (embora possam não saber que é disto que se trata). Quando acusam um filho de ser egoísta ou ausente e o filho reage, a reação em si oferece ao progenitor a sensação de estar correcto na sua acusação, de outra forma porque reagiria assim o filho? A diferença entre reação e resposta a uma falsa acusação ou ataque pessoal é simples. Na reação o nosso comportamento é uma resposta de sobrevivência (atacamos de volta, submetemo-nos ou afastamo-nos - levantamos o tom de voz, insultamos, saímos porta fora, ou ficamos em silêncio à espera que a tempestade passe). Na resposta fazemos uma pause de 6 ou 7 segundos, respiramos fundo e informamos não só acerca do que estamos a experienciar com um aviso do que poderemos fazer se a situação se repetir. 


Situação 

Reação

Resposta

Almoço em família. Mãe diz à filha que tem um péssimo gosto na escolha dos namorados (estando o namorado da filha presente).

Filha reage zangada, dizendo que é o primeiro namorado que a mãe conhece e não tem o direito de a diminuir assim dessa maneira.

Depois de respirar fundo foca a atenção no irmão sentado em frente e responde calmamente “Ouviste o mesmo que eu? Não percebo se a mãe quer passar a ideia de uma filha mentecapta ou se apenas esquece que o João é o meu primeiro namorado que ela conhece.”

Continuando. A mãe, depois da reação da filha, atira ao ar um “Calma, minha filha, não sabia que eras tão sensível!” - não reconhece nem pede desculpa pelo efeito do seu comentário.

Ao reagir a isto, a filha irá ser acusada de todo o mal-estar criado durante o almoço. Não importa o que diga, será o bode expiatório.

Uma resposta adequada seria, depois de respirar fundo, chamar a mãe pelo nome e informar do efeito das suas palavras. “Mãe, ao dizer isso faz-me sentir fraca e sem voz. Se voltar a fazê-lo terei que ir embora.” - E é mesmo importante cumprir, caso contrário em vez de estabelecer limites estará a chantagear.


O passo mais difícil para qualquer um de nós é reconhecer que o nosso pai/mãe/irmã/tia é uma pessoa tóxica, sem qualquer disponibilidade para mudar o seu comportamento e, por este motivo, darmo-nos o espaço suficiente para termos em consideração os nossos limites e necessidade. Não é a nossa função mudar o comportamento tóxico do outro mas sim saber comunicar as nossas necessidades quando interagimos com este tipo de pessoas.

No próximo workshop do dia 28 de setembro, no Porto, iremos praticar variadas respostas a situações de conflito assim como afirmações que fazem saber ao outro quais os nossos limites, sem perder a calma, sem vitimização e, sobretudo, a sabermos dar-nos valor como seres humanos.

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