A aventura de estar vivo

Se observarmos uma criança poderemos ver que a sua natureza é a curiosidade. Usa os sentidos para descobrir o mundo à sua volta. Não sabe o que vai acontecer a seguir. Se mexer naquela coisa enorme colorida encima da mesa, qual será o som que vai fazer ao cair no chão? Um som novo! E a seguir o som da mãe zangada porque o seu jarrão favorito já não é. E se puxar o rabo do gato, como é que ele irá reagir? E descobre o doce sabor das lágrimas depois dos arranhões nos braços. E a ameaça do pai por ser má.
E a curiosidade, o espírito de aventura, de não saber o que vai acontecer a seguir, é a nossa natureza. É esta curiosidade que conduziu e conduz pessoas como Einstein ou Lady Gaga, Edison ou Picasso.
Nesta fase de descoberta os adultos ensinam-nos a ter muito cuidado. Aprendemos a procurar a segurança da vida, e a tentar controlar essa vida. Uma vida de aventura é transformada num tédio em que não há nada de novo a partir dos cinco ou seis anos. E olhamos para os rebeldes como sendo inferiores, mal-educados, aberrações. E talvez o façamos com um pouco de inveja também.
Quando nos apaixonamos vivemos por um pequeno período de tempo a mesma aventura da infância. A descoberta do outro! O não saber e ser surpreendido! A curiosidade e aventura de estar vivo! A nossa natureza.
Mas dura pouco tempo, porque graças à formatação herdada, iremos querer o controle e a segurança. Iremos querer saber com quem o outro está, onde está, a fazer o quê, e, mais importante, quando voltará a estar connosco.
Bem-vindos ao tédio.
É aqui que começamos a viver um verdadeiro paradoxo. Por um lado queremos o entusiasmo, a aventura inicial da relação, a adrenalina e a serotonina do início. Por outro lado queremos controlar o outro. Queremos segurança.
A isto chama-se viver no inferno. Queremos, mas não queremos. Não queremos, mas queremos. Mais do mesmo.
Morremos um pouco mais de cada vez que esquecemos a nossa natureza. O controle e a segurança são aspectos contra-natura. Não são possíveis.
Quando acreditamos que temos tudo sob controle, e não haverá novidades, a vida prega-nos uma partida. Filhos morrem, maridos pedem o divórcio, esposas queimam o jantar. E isto, meus queridos, quer gostemos ou não, é a vida a viver-se. De mil e uma maneiras.
Podemos olhar para o que acontece como uma grande aventura. Ou podemos deprimir-nos, ou viver numa ansiedade louca, em busca de uma vida segura.
Permitir que cada pessoa na nossa vida seja quem é, e nós próprios permitir-nos ser quem somos. É aqui que reside a alegria de viver.
E quem sou eu? Não saber responder a esta questão é a liberdade absoluta. Sou meigo, e sou descuidado, e sou louco, e sou estúpido, e sou mau, e sou impaciente, e sou tolerante, e sou carinhoso, e sou carente, e sou inteligente. Sou tudo. Sou nada. Apenas curioso para descobrir a próxima pessoa a surgir aqui. Sem uma imagem a defender.
Aventureiros já todos fomos. Curiosos acerca da vida já todos fomos. Sem um rótulo de bom e mau, a vida vive-se na perfeição. Sem a necessidade de uma justificação, a vida torna-se leve.
Aquilo que é, é. E o que tiver que ser, será.

Qual será o som dos livros da estante a caírem no tapete?...  

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