sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

Ciência e Pseudociência

As redes sociais trouxeram consigo alguns benefícios, sobretudo no que toca a partilha de informação. Contudo esta partilha de informação significa que literalmente tudo é partilhado, desde a descoberta de um novo exoplaneta pela NASA até às teorias de conspiração do Manel dos Limões que passa os dias a fumar uns charros e a insultar qualquer ser humano que discorde das suas teorias.


Por este motivo explico a diferença entre o que é a ciência e o que o Manel dos Limões faz quando não está a fumar um charro (eu sei, estou a generalizar, há pessoal com habilitações académicas que cai facilmente no logro da pseudociência).


A Ciência procura a crítica, é através da crítica dos pares (outros cientistas) que pode evoluir. A Pseudociência odeia a crítica, transformando em inimigo qualquer pessoa que ouse duvidar do que é dito.


A Ciência usa um vocabulário próprio, claro, sem possibilidade de segundas interpretações. A Pseudociência prefere o calão, e palavras que confundam e possam ser interpretadas de várias maneiras.


A Ciência declara uma descoberta depois de muito estudo, análise de dados, e anos de investigação. A Pseudociência gosta da grandiosidade das suas descobertas, sem qualquer base  credível, porque alguém disse logo tem que ser verdade.


A Ciência segue um rumo através de evidências, coloca-se questões e procura respostas. A Pseudociência dá primeiro as respostas e depois procura a evidência que demonstre que a resposta está correcta.


A Ciência tem em conta todos os dados e argumentos, experimenta e assume erros. A Pseudociência procura apenas os dados que suportem as suas teorias, descartando qualquer facto desfavorável às mesmas. 


A Ciência recorre a métodos de investigação rigorosos e promove a repetição desses métodos por cientistas em qualquer parte do mundo. A Pseudociência não possui método, não permite a repetição de um teste e exige que se acredite no que é dito sem considerar qualquer argumento ou análise.


A Ciência baseia-se na revisão por pares de qualquer resultado, outros cientistas irão analisar o que é descoberto e verificarão a veracidade do mesmo. Há um mundo de competitividade onde um cientista sobretudo irá verificar a veracidade do que é descoberto por outro cientista. A Pseudociência é feita por indivíduos que regra geral trabalham por conta própria, assumem estar certos e não permitem que outros critiquem ou investiguem as suas descobertas assombrosas.


A Ciência é criada a partir de um raciocínio lógico e cuidadoso, há toda uma sequência de eventos estudados e elaborados pelo cientista por forma a não permitir a subjectividade. A Pseudociência recorre a teorias inconsistentes e contraditórias, muitas vezes carentes de qualquer lógica e sem fundamento.


A Ciência muda. O que ontem era verdade, hoje é duvidado e amanhã é falso. A Ciência evolui, assume erros e muda de acordo com novos dados que vão surgindo. A Pseudociência é sobretudo dogmática, como a religião. Obriga os seus seguidores a acreditar no que é dito sem questionar. É imutável. Se era verdade para o Homem de Neandarthal, também é verdade hoje. 


Hoje em dia vivemos inundados por informação pseudocientífica. Muitas pessoas pegam num parágrafo que leram no Facebook, mais umas linhas no Twitter, mais o que está escrito no livro do Génesis e elaboram uma teoria que acreditam ser à prova de qualquer análise ou crítica independente. 


Quando te chegar informação acerca do que quer que seja, ser-te-à relativamente fácil verificar a sua veracidade. Alguns dos erros mais comuns na pseudociência:


  • Não há indicação de um estudo específico efectuado (há uma diferença entre afirmar “O ensaio na Jonhs Hopkins que envolveu 12 mil participantes - link para o ensaio aqui”, e “um estudo mostrou que 67% das pessoas morreram”);
  • Erros ortográficos. Embora cientistas estejam mais interessados nas suas investigações do que na ortografia e gramática, eles sabem que um artigo para ser publicado não pode conter erros;
  • Afirmações generalizadas e sem apontarem estudos concretos (nota a diferença entre “Segundo um estudo da Oxfam efectuado no Uganda e Quénia, e que envolveu 65 mil participantes, 97% das pessoas não sobrevivem ao Ébola - link para o estudo aqui” e a afirmação “Depois de visitar o Uganda e Quénia sei que as mortes provocadas pelo Ébola são muito menos do que os media afirmam”);
  • Artigos científicos fazem referência ao cientista, ou cientistas, envolvido assim como o laboratório, técnicas utilizadas, dados demográficos, métodos, enquanto que o pseudocientista refere-se a si mesmo como autor inquestionável das suas descobertas, sem qualquer apresentação de dados verificáveis por terceiros;
  • Generalizações, são por norma o campo da pseudociência. A Ciência gosta de números factuais, vive o sadomasoquismo da bio-estatística. Já a Pseudociência atira com números ao ar. Um exemplo disto é a percentagem de mortes causadas pelo covid19. O valor estatístico tem sofrido alterações praticamente todas as semanas, porque cientistas continuamente analisam dados e procuram respostas. A Pseudociência desde o início da pandemia que não altera esta percentagem (indo de 0,9% a 1,7%);
  • Sim, há médicos a falar abertamente de ciência, regra geral são aqueles que não fazem ciência nem lidam diariamente com o drama de perder uma vida ou sentir a impotência de não poder ajudar quem sofre.


Resumindo e simplificando este artigo, quando te bater à porta um artigo científico verifica apenas se nesse artigo há indicações específicas acerca dos estudos feitos, onde foram feitos, como foram feitos, e quem os fez. O artigo que faz afirmações sem apresentação de dados verificáveis é invariavelmente pseudociência (gostaram da minha generalização? Podem acreditar, levo anos a generalizar, sou perito nisto).

quarta-feira, 6 de janeiro de 2021

Aprender a amar


Amar outro ser humano é algo universal e essencial ao bem-estar físico, mental e emocional de qualquer um de nós.

Todavia não há um curso, uma aula, um workshop, que nos ensine com especificidade quais os gestos que demonstram amor e quais os que demonstram carência afectiva ou mesmo abuso.


Sentirmo-nos amados provoca no nosso cérebro um cocktail fascinante de dopamina, serotonina, umas quantas endorfinas, e eventualmente ocitocina. Estas moléculas são responsáveis por nos fazer sentir que estamos protegidos, podemos confiar, é seguro sermos quem somos e podemos expressar-nos sem receio.


Apesar de cada um de nós ter formas específicas de se sentir amado e de mostrar que ama, há comportamentos de base que todos podemos cultivar.


Tradicionalmente as formas como amamos são:


  1. Ser de serviço. Implica preparar uma refeição, dar banho, fazer um recado, ajudar a resolver um problema que afecta o outro, estar disponível para ouvir;
  2. Partilha de momentos. Ir passear de mãos dadas, ver uma série ao lado do outro, ir de férias com o outro, rir e chorar com o outro;
  3. Presentes. Oferecer um presente significa “pensava em ti quando não estavas presente”. 
  4. Elogios e Reconhecimento. Agradecer algo que o outro fez ou disse, notar o novo penteado ou o casaco que combina com os sapatos, o trabalho feito, etc;
  5. Toque físico. Uma carícia, um abraço, ou aconchego.


Todos temos uma forma principal e uma secundária de mostrar que amamos e também temos uma forma principal e secundária de nos sentirmos amados. E podem não ser as mesmas! Por exemplo, eu amo sendo de serviço a outros e com presentes. Mas sinto-me amado com presentes e reconhecimento. Ou seja, eu não preciso que alguém reconheça quando sou útil. Mas quando sou útil e a outra pessoa reconhece o meu serviço sinto a serotonina até aos dedos dos pés!


O mais importante disto é não fingir. Jamais ser de serviço para que o outro nos ame, ou dar um presente porque sabemos que é assim que o outro se sente amado. Ser natural e autêntico é o mais importante.


Outro aspecto do amar: ouvir o outro sem o querer corrigir, mostrar-lhe que está errado ou que deve mudar. Ouvir, mostrar interesse genuíno por aquilo que o outro diz. Não interromper o discurso do outro. Na comunicação com outros é mesmo importante manter presente isto: o que estou a dizer é útil ou acrescenta bondade na vida do outro? A comunicação numa relação íntima deve ser fluída, não mais que dois minutos ou três de conversa e deixar espaço para que o outro se expresse também. Caso não respeitemos estes tempos, e se o que dizemos não é útil ao outro, ele ou ela irá naturalmente produzir epinefrina, a molécula da luta ou fuga. 


Quando amamos é ainda importante ser professor e aluno. Quer isto dizer que faz parte de uma relação indicar ao outro quando tem um comportamento inapropriado, e permitir que o outro também nos diga quando somos nós. Não levar a peito estas aprendizagens. A melhor forma de o fazer é focar a atenção no comportamento e não na pessoa. Há uma diferença entre dizer “Estás atrasado” e dizer “quando te atrasas eu faço filmes mesmo negativos, sei que o problema é meu, como poderíamos ultrapassar isto?” - e ouvir a resposta sem querer que o outro mude. E podemos ainda verificar onde é que nós também nos atrasamos.


Vamos agora ver os sinais que nos indicam que um relacionamento é tóxico e até perigoso.

        1. Intensidade

Uma relação intensa, em que acreditamos que não conseguimos viver sem o outro, mas queremos que o outro seja como nós queremos para podermos estar bem. É normal haver alguma intensidade no início da relação, mas o importante é ficar atento a como evolui. Se a relação é feita continuamente de altos e baixos, estamos muito bem ou estamos muito mal, amo-te muito e não te posso ver à frente, isto significa que estamos a alimentar uma relação tóxica. 

        2. Isolamento 

É natural de início querer estar o máximo de tempo com a outra pessoa. Mas se continuamente queremos o outro presente, em que exigimos que exclua tempo com a família e amigos, em que o outro não pode ter actividades sem a nossa presença, estamos a caminhar para uma relação tóxica. Observa sobretudo se criticas os amigos do outro ou tentas dizer-lhe quais os amigos que deve manter e quais devem ser afastados.

        3. Ciúme 

Quando há uma necessidade de saber onde o outro está, com quem está e o que está a fazer. Acusar o outro de flirtar, de mostrar interesse em outros. Isto demonstra uma insegurança e carência afectiva tóxicas.

        4. Inferiorizar 

O proverbial “deita abaixo”. Quando fazemos acusações e não aceitamos uma explicação, mas quando o outro nos acusa a nós temos sempre uma justificação. Apontamos o dedo para ferir, afirmamos que o outro é menos que, não presta ou tem pouco valor na nossa vida. As nossas palavras fazem o outro saber que é o elemento fraco da relação.

        5. Volatilidade 

Quando a relação é feita de extremos opostos diariamente. Ao invés da Intensidade, na Volatilidade damos por nós a chorar e a dar muita importância a coisas sem importância. Queremos ser o centro do universo do outro. O outro tem que adivinhar o nosso estado emocional continuamente. Afirmamos que o outro é importante na nossa vida e o amamos, e no minuto seguinte estamos a mostrar-lhe todas as suas falhas. Impomos condições mas não queremos assumir a nossa parte da disfuncionalidade na relação. Normalmente acreditamos que as nossas falhas são ridiculamente sem importância enquanto as falhas do outro são um tsunami de horrores e sofrimento.

        6. Imaturidade

Quando interpretamos o comportamento do outro continuamente de forma negativa, vemos no outro alguém que propositadamente nos quer magoar, não comunicamos claramente as nossas necessidades ou exageramos os defeitos do outro. Colocamo-nos no centro da vida do outro e queremos que nos faça garantias que nenhum ser humano pode garantir (“promete nunca olhar para outro homem/mulher”, “tens que me conquistar” ou “prova-me que posso confiar em ti”). 


O Romantismo e como este é tóxico para qualquer relacionamento adulto


Inicialmente o Romantismo era uma corrente literária que passou eventualmente a uma filosofia de vida. Esta filosofia de vida pressupõe uma narrativa fantasiosa impossível de realizar enquanto seres humanos.


No Romantismo os dois apaixonados sentem imediatamente no primeiro encontro que estão destinados um para o outro. Nada nem ninguém os irá separar. Haverá drama, provocado por familiares, amigos e um, ou uma, estranho que irá testar o amor que um sente pelo outro. No Romantismo encontramos uma felicidade intensa, uma atmosfera de luxo (desde banquetes a passeios à beira mar ou num bosque cuidado e lindo como as estrelas). O Romantismo não tem crianças para educar, cozinhas para arrumar, empregos que exigem muito tempo e energia nem horas de carro ou transportes públicos para o trabalho. No Romantismo não há envelhecer, os personagens morrem cedo, por vezes dias depois de se conhecerem. O amante compreende e conhece na totalidade o ser amado. Sabe o que outro quer, quando quer e como quer. 

E, acima de tudo, o Romantismo afirma que a pessoa amada não tem defeitos e é possível amar a totalidade que é, sem tirar nem pôr. 


Obviamente isto é uma receita para o desastre. 


Primeiro, é impossível compreender o outro. Compreendermo-nos a nós mesmos é em si uma tarefa herculeana, como poderá o outro compreender um décimo da complexidade que somos?


Em segundo lugar, sabemos hoje que aquilo a que chamamos “apaixonar” nada mais é que um truque do nosso cerebelo que reconhece na outra pessoa alguém que nos irá proporcionar as mesmas experiências emocionais que vivenciamos nos primeiros anos de vida (o cérebro não gosta de aprender novas formas de se relacionar com outros, prefere manter a aprendizagem inicial, gasta menos energia). 


Terceiro, amar outro ser humano significa aceitar as suas falhas tanto como as suas virtudes. Isto significa que as duas pessoas numa relação assumem um compromisso de se educar um ao outro. Sem levar a peito nem exigir que o outro assimile a aprendizagem imediatamente ou mude logo que é chamado à atenção. 


Quarto, amar outro ser humano não pode ser uma vida de passeios, banquetes e hotéis de cinco estrelas. Significa sim momentos gratificantes e momentos difíceis, confusos e de um desentendimento temporário. 


Quinto, amar outro ser humano é sabê-lo tão vulnerável quanto nós. Que muitas vezes iremos falhar, como o outro também irá falhar. Significa uma aventura. Ao contrário do Romantismo, que é todo ele rosas e perfumes caros, com a adição de um personagem que tenta desestabilizar a relação, uma aventura significa momentos de stress, de não saber o que fazer, parar, respirar fundo, e continuar. 


Sexto, o Romantismo diz-nos que não deve haver qualquer esforço na relação, tudo deve ser fluído e transparente. A realidade diz-nos que a transparência não é possível enquanto ficarmos amuados com os comportamentos do outro.


Maturidade implica saber que não é o comportamento do outro que nos magoa, mas apenas a nossa interpretação desse comportamento. Qualquer “deverias” ou “tens que” ou “precisas de” são elementos tóxicos numa relação a dois. Porque cada uma destas obrigações implica a rejeição da individualidade. 


Para terminar, já pensaste porque os filmes do Walt Disney terminam sempre após a boda com um “foram felizes para sempre”?… Porque se o filme continuasse iríamos descobrir que o “felizes para sempre” não existe, é um mito. 


Então, ao invés do Romantismo, podemos criar na relação um espaço para aprendizagem, para sentir medo, mágoa e ternura, sexo e arrumar a cozinha. Uma relação com maturidade incluirá o bom e o mau, em medidas muito idênticas. 


O importante é manter presente que não é o que o outro faz ou diz que nos causa qualquer emoção, mas sim a nossa interpretação daquilo que o outro diz ou faz. Então, perante uma situação de stress que é aparentemente provocada pelo outro, podemos questionarmo-nos. Qual a interpretação que estou a fazer deste comportamento? Onde aprendi a reagir desta forma a este comportamento? De que maneira eu tenho o mesmo comportamento?


E isto é, resumidamente, o que torna uma relação a dois madura, adulta.


PS. A única pessoa que pode rejeitar-nos, magoar-nos ou deixar-nos infelizes é aquela que vemos em frente do espelho todas as manhãs. Os outros irão reflectir aquilo que tentamos esconder.

segunda-feira, 21 de setembro de 2020

Redes Sociais e as moléculas da emoção

Somos criaturas sociais - a sobrevivência do indivíduo depende da rede social que consegue manter.

A manutenção de uma rede social provoca a libertação de dopamina quando a interação é positiva ou proveitosa. A dopamina é a recompensa, o prazer, que recebemos quando as nossas ações fortalecem a rede social a que pertencemos. Por outras palavras, sempre que observamos que as nossas ações levam a que outros gostem de nós, a recompensa é dopamina.


A dopamina afecta a nossa motivação. Temos um comportamento que beneficia o grupo e a dopamina resultante deste comportamento leva-nos a comportamentos idênticos no futuro. Neste sentido é uma molécula que estimula a socialização. Mas com as redes sociais virtuais, e com um simples “like”, a produção de dopamina é imediata. O cérebro leva-nos a acreditar que estamos a socializar, quando o oposto é mais real. A dopamina tem um outro efeito, mais perverso. O facto de muitas pessoas “gostarem” de algo que publicámos leva o cérebro a acreditar que estamos certos, somos pessoas boas. As pessoas que mais utilizam a internet são as que mais dificuldade têm em assumir que podem estar erradas. 


A dopamina ajuda-nos a focar a atenção em algo. O problema é que focamos a atenção naquilo que possa provocar uma dose da mesma, e quantas mais doses diárias maior o sentimento de estarmos a fazer algo de bom. Focamos a atenção nos “likes”.

A dopamina é altamente viciante - a nossa sobrevivência depende de outros gostarem de nós.


A dopamina é a responsável por nos assegurar que somos pessoas boas a fazer o que é correcto, que estamos certos e temos razão. Cada dose de dopamina faz-nos acreditar nesta incongruência. Não somos pessoas boas, somos imperfeitos, bons e maus, e isso é importante no processo de maturidade emocional. Saber-me imperfeito leva-me a aprender mais, a estar mais atento aos outros. O que acontece quando o cérebro diz que estamos certos e somos bons? De início tornamo-nos focados, atentos, apreendemos a informação de uma maneira mais rápida. Mas um “caldo" cerebral com um excesso de dopamina em poucos anos terá o efeito oposto. A solução farmacológica para esta situação é aumentar as doses de drogas semelhantes às anfetaminas (os medicamentos dados a crianças e adultos para hiperactividade e deficit de atenção, como o metilfenidato). Pessoalmente acredito que há um número bastante reduzido de crianças que podem beneficiar deste tratamento. Repito, um número reduzido.


Um “like” é o mesmo que alguém dizer-me “tens razão” em termos neurológicos. E isto é perigoso em termos de construção da personalidade. Basta observar como cada vez é mais difícil a um ser humano assumir estar errado ou não saber, assim como também é muito difícil lidar com a rejeição, o ouvir um “não”. No inconsciente o discurso é algo como “então tenho tanta gente a gostar de mim e esta pessoa diz-me “não”?! Tem que haver algo de profundamente errado aqui, e não sei o que é”.  


Um excesso de dopamina leva-nos ainda a falar incessantemente, sem querer ouvir os outros. Ao falarmos estamos muitas vezes a receber as nossas doses de dopamina, a obter a atenção dos outros. O reverso da medalha é este: se falamos demasiado podemos obter altas doses de dopamina, mas quem nos está a ouvir recebe doses elevadas de epinefrina - a molécula da luta ou fuga. A brincar costumo dizer que se não tens uma vida íntima com outros é porque não os estás a ouvir. 


A comunicação com os outros é um outro tema, deixo aqui apenas uma pista. Quando falamos estamos a alardear ou a partilhar? Alardear é o que acontece quando queremos que os outros nos ouçam porque sim, porque somos bons, ou já fizemos muita coisa, ou somos especiais (mesmo que pela negativa). Partilhar acontece quando aquilo que dizemos é útil aos outros, irá beneficiá-los. 


O nosso cérebro nada evoluiu nos últimos milhões de anos. No entanto a tecnologia tem evoluído a uma velocidade de mais de 700% ao ano (a percentagem real é assustadora - imagina isto: és capaz de calcular o resultado de 8x9, certo? E se em menos de um segundo fosses capaz de calcular 894x765432927349? - é a esta velocidade que a tecnologia está a evoluir). 


Qual o esforço necessário para que um grupo reduzido de indivíduos mostre aceitar-nos ou gostar de nós? - a família, vizinhos, colegas, amigos - entre cinco a vinte e cinco indivíduos? 


Com o surgimento das redes sociais passamos a interagir com centenas e milhares de indivíduos, mas o nosso cérebro não compreende que são relacionamentos virtuais que em nada asseguram a sobrevivência. 


Isto leva a uma busca constante de “likes”, “corações” e outros emoticons que nos mostram que os outros gostam de nós. Cada “like” recebido é uma pequena dose de dopamina recebida, uma recompensa e deleite.


Um excesso de dopamina pode levar a condições como a esquizofrenia, loucura, demência. Já uma deficiência leva a Parkinson’s, défice de atenção e hiperactividade. 


Há ainda o reverso da medalha. Quando temos a percepção de os outros não gostarem de nós produzimos epinefrina. A epinefrina leva a uma maior atenção a tudo que há de negativo à nossa volta, a criar medos e ansiedades.


O que acontece quando um elemento da família ou do grupo de amigos não gosta de nós? Tentamos corrigir-nos para alterar a situação ou focamos a nossa atenção num outro elemento. Mas o que acontece quando não é um indivíduo que não gosta de nós, mas dezenas ou centenas de desconhecidos sobre os quais nada sabemos?


Com já afirmei antes, a dopamina é altamente viciante e tudo o que precisamos para ter a nossa dose é um simples “like” em algo que publicamos numa rede social. 


Para uma boa saúde mental são necessárias ainda outras moléculas, como a oxitocina. Este neuropeptideo é produzido apenas numa interação directa com outros indivíduos. Num abraço, um aperto de mão, um beijo, práticas sexuais em que nos sentimos desejados e desejamos o outro. A oxitocina é a hormona que nos faz sentir seguros, amados, a pertencer a um grupo, a confiar na vida, a sentir empatia, generosidade e bondade. Sem oxitocina o individuo não consegue ter qualquer uma das experiências anteriores. Sem oxitocina o indivíduo acredita viver num mundo perigoso, sem uma rede de segurança, incapaz de amar ou sentir-se amado. A oxitocina leva ainda a desconfiarmos de estranhos (sentimento de auto-preservação) e mesmo a afastar-nos de situações potencialmente perigosas. É a hormona do amor. Amor por nós e pelos que nos são próximos. Sem oxitocina não temos discernimento para evitar predadores, como pedófilos, por exemplo.


Um indivíduo viciado em dopamina irá perder muita da sabedoria e experiências proporcionadas pela oxitocina. 


Entramos num ciclo vicioso de sermos bons e essenciais e de estarmos sempre certos, e no entanto aos poucos apodera-se de nós um sentimento de vazio e inutilidade. Quanta mais dopamina, quanto mais nos parece que o mundo gosta de nós, maior a sensação de insegurança, de estar perdido e não ser amado. É o paradoxo das redes sociais.


Podemos ir ainda mais longe nesta análise das moléculas da emoção. A oxitocina é catalisadora na produção de serotonia, a molécula que impede a depressão e ansiedade, reduz a agressividade, ajuda-nos na aprendizagem, provoca o optimismo, combate a dor e deixa-nos num estado de intimidade com os que nos rodeiam. É a molécula da confiança. 


Viciados em dopamina experimentam dias e dias sem uma expressão saudável de serotonina, ou seja, apesar de acreditarem que o mundo gosta deles, no seu mais intimo sentem-se sós. Não confiam na vida.


As redes sociais estão a criar indivíduos que ganham muito, mesmo muito dinheiro pelos “likes” que obtêm, mas que por outro lado os torna prisioneiros de um mundo virtual. Estamos a viver um paradoxo em que quanto mais conectados com o mundo virtual, mais desconectados nos tornamos com o mundo real. 


As redes sociais ajudaram também a acreditar em fantasias. Como os filhos devem ser, ou os maridos, ou os pais. E quando estas pessoas nas nossas vidas não se comportam como deveriam, de acordo com o Facebook, Instagram, e outros, acreditamos que há algo de errado com eles. Acreditamos que devem melhorar-se, deixar de ser imperfeitos. 

Pessoalmente considero alarmante se estiver em casa de amigos e os filhos de quatro ou seis anos forem “bem comportados” ou não se dedicarem pelo menos a uma birra. É suposto as crianças serem desarrumadas, fazerem birra, odiarem os pais e não os respeitar. Isto é a condição humana. Um pai pode apenas aprender a arte da paciência e da autoridade (não é fácil, nem é como mostram as fotos divinais que muitos publicam nas redes sociais).


As redes sociais, o uso de drogas legais para manter-nos focados e capazes de uma super-humanidade têm um preço elevado: ficamos esgotados e incapazes de lidar com as trivialidades no seio da família. Muitos chegam a casa e usam o telemóvel como fuga às suas responsabilidades. E, pior ainda, entregam aos filhos um telemóvel ou tablet para que estes aprendam bem cedo a fugir à realidade.


Posto isto, há alguns, embora poucos, benefícios nas redes sociais. Pese embora que 90% da informação nas redes sociais seja falsa (Pew et al, 2017).


Soluções para a interação com redes sociais


Recuperar o bom senso. Isto implica saber quando e como utilizar as redes sociais. Implica perguntar-nos, quando acedemos a uma rede social, “o que é que eu pretendo agora?” - significa  também perguntar-nos “qual o meu objectivo ao publicar algo numa rede social?”.


Fazer uma lista de prioridades humanas. Muito basicamente, fazer uma lista das pessoas que consideramos importantes na  nossa vida. Pai, esposa, filhos, colegas, amigos. Envolver toda a família neste processo. Durante uma semana colocar um sinal + de cada vez que interagimos com as pessoas desta lista e acreditamos que a interação foi positiva. Isto irá dar-nos uma perspectiva do tempo que despendemos com uma verdadeira rede social. Irá ainda ajudar a compreender deficiências emocionais, porque nos tornamos mais ou menos agressivos, porque atacamos os outros, porque andamos mais ansiosos ou sem paciência. 


Fazer uma lista do que pretendemos de cada rede social, sendo racionais e objectivos. O que pretendo obter quando abro esta aplicação? Facebook, Instagram, Twitter, etc.


Eliminar aplicações de redes sociais dos telemóveis. Pode parecer radical, porque o é. As redes sociais sabem como captar a nossa atenção. Caso precises mesmo da aplicação no telemóvel, desliga as notificações. 


Criar a regra de nunca, mesmo nunca, levar o telemóvel para acompanhante de uma refeição. Mesmo que o telemóvel toque, deixá-lo tocar. Nada é assim tão urgente, o mundo não vai parar por não atenderes um telefonema, e se for uma urgência é melhor que a pessoa que nos liga telefone para o hospital. 


Fora das horas de trabalho escolher uma hora específica em que vamos verificar os emails. Por exemplo, entre as 22h e as 22.15h. Mais de 15 minutos a ver e responder a emails fora das horas de trabalho é roubar tempo e experiências emocionais aos que nos são queridos. 


Decidir o tempo real que queremos dedicar às redes sociais. No meu caso, por exemplo, são 15 minutos de manhã e outros 15 minutos depois do jantar. Publicar algo apenas se efectivamente é útil aos outros. A minha regra de ouro, antes de publicar algo é simples: isto que vou publicar acrescenta bondade ou um sorriso na vida dos outros? Isto que vou publicar é informação útil aos outros e é verdadeira? - um não significa a não publicação. 


Resumindo: o minuto que pensas que és capaz de controlar os teus pensamentos ou ações, é o minuto em que qualquer outro ser humano ou Inteligência Artificial (conhecida por “algoritmos”)  consegue manipular-te. É muito mais fácil do que imaginas.

sexta-feira, 17 de abril de 2020

Pandemias, Ciência e Misticismo

Acredito que a grande maioria das pessoas está mal educada na área das ciências. Em realidade muitas pessoas acreditam que “fazer” ciência é parecido a uma qualquer religião em que se vomita uma informação qualquer e acredita quem quiser.

Há ainda pessoas que são totalmente contra a ciência e tecnologia (e usam essa tecnologia para se fazerem ouvir, inconscientes da ironia).

Podemos começar pela peste negra, ou bubónica, que avassalou o planeta entre 1347 e 1351. Calcula-se que matou entre 75 a 200 milhões de seres humanos. Na Europa matou entre 30 a 60 por cento da população. Na altura as pessoas morriam e ninguém sabia o motivo. Acreditava-se na ira de um Deus, nos pecados do Homem, etc. Não havia a ciência nem tecnologia que há hoje para se saber que afinal era uma pulga, transportada por ratos em carregamentos que faziam a Rota da Seda, desde a China, a portadora de um vírus tão letal. A recuperação, na Europa, levou duzentos anos. 
Mais tarde surgiu a gripe espanhola, entre 1918 e 1920. Foram infectados cerca de quinhentos milhões de seres humanos, um quarto da população mundial. Morreram entre dezassete a cinquenta milhões de pessoas (não havia a tecnologia necessária para contabilizar melhor estes números). A maioria dos surtos desta gripe matava os mais jovens e mais idosos. A desnutrição, falta de higiene e uma pobreza generalizada contribuíram para uma taxa de mortalidade tão elevada. E, mais uma vez, não se sabia ao certo a causa de tanta mortalidade. A ciência ainda não tinha evoluído o suficiente para poder ajudar.

Chegamos ao século XXI. Três pandemias em vinte anos, sendo que as duas primeiras passaram despercebidas a muita gente sobretudo porque as suas condições de vida eram desfavoráveis à propagação do vírus. 
Temos agora o Covid 19. É graças à ciência e a cientistas dedicados em todo o mundo que nos é possível saber do que se trata (as pessoas que gostam de teorias de conspiração têm o direito de se dedicar às mesmas, verifiquem apenas se enquanto se dedicam a espalhar informações baseadas em pressupostos, em hipóteses não demonstradas e intuições mais ou menos espirituais, estarão a ajudar a melhorar a situação da população ou apenas a contribuir para mais medo e pânico).

A ciência baseia-se em factos. Os cientistas sabem que aquilo que hoje é verdade, amanhã não o é. O conhecimento evolui e a tecnologia também. Mas há uma coisa de que podemos ter a certeza: um cientista faz uma afirmação baseando-se em conhecimento demonstrável (ok, nem sempre, como em todas as áreas, há aqueles que atiram com suposições ao ar e os media encarregam-se de tornar essas suposições como verdades). A realidade é que a ciência não pede para ter fé ou acreditar em algo inatingível. Possui factos, ou não possui.

Há coisas más na ciência e tecnologia? Há, claro que há. Também há coisas más nas seitas e religiões do mundo. 

Um chá de gengibre é bom para ajudar a colmatar os sintomas de uma gripe? É, claro que sim. Uma sessão de reiki ajuda o sistema respiratório? Acredito que sim. O problema é quando alguém acredita que será o reiki ou o chá de gengibre a tratar alguém que está com uma falha no sistema respiratório e a necessitar de um ventilador.

É saudável, no meu parecer limitado, cuidarmos de nós e daqueles que amamos recorrendo a tudo aquilo a que temos acesso e possa melhorar a saúde. Já não me parece saudável uma atitude de desacreditação na ciência e nos avanços feitos nos últimos cinquenta anos. Sem a tecnologia que temos hoje, muito provavelmente não teria sido possível aos governantes tomar as medidas que tomaram a tempo de poupar muitas pessoas mais fragilizadas. É ainda a tecnologia que permite mantermo-nos em contacto com aqueles que nos são importantes. É a ciência a responsável, em grande parte, pela erradicação de doenças fatais nos últimos sessenta anos. 

Muitas pessoas, envolvidas em luz e amor infinitamente incondicional, vomitam muita história mas na prática contribuem menos que um piolho para a melhoria da vida dos seres humanos. Seria melhor uma atitude de colaboração entre todos, partilha de conhecimento e de bens. Mas conhecimento baseado em factos e não em medos ou inspirações. 
Aqueles que são contra a tecnologia sugeria que a deixassem de usar, seria mais congruente. Aos que duvidam da ciência, por favor isolem-se numa ilha e vivam felizes.

O ponto de equilíbrio, ou harmonia, pode ser encontrado num estado em que usamos os recursos disponíveis sem a pretensão de que uns são melhores que outros. O ser humano só faz comparações por três motivos: para provar que é superior aos outros, para provar que é inferior aos outros, ou para melhorar algo. 

Em qual destes grupos queres participar?

quarta-feira, 25 de março de 2020

As Notícias

Em primeiro lugar, pessoalmente sou a favor do distanciamento social e do isolamento, nesta notícia do covid-19.

Este artigo é apenas uma análise de como as notícias são muito mais um desserviço do que um meio de informação. Para esta análise irei pegar na grande notícia do momento a nível mundial: a pandemia provocada pelo covid-19.

As notícias falham sobretudo devido a três factores: não contextualizam a informação, não permitem um espaço para a reflexão, e não apontam qualquer resolução perante uma situação de conflito ou perigo. 

Abrir um noticiário, com um tom de voz grave a anunciar “33 mortes em Portugal até ao momento causadas pelo covid-19” é sensacionalismo puro. É uma forma de semear o pânico, o terror e a instabilidade social. Tal como as religiões, é uma forma de dizer “quem fica em casa é contra quem não fica em casa”, “nós contra eles”. Isto é perigoso em termos de manter uma estrutura social coesa e colaborativa. O ser humano, quando faz asneira, aprende e corrige-se mais facilmente através de um melhor conhecimento das suas falhas e efeitos produzidos nos outros do que através de uma simples acusação. Se dissermos a quem quer que seja que está a ser estúpido, essa pessoa agora é forçada a provar que não o é. 
Esta notícia poderia ser divulgada de outra forma. “Em Portugal, segundo o Instituto Nacional de Estatística, morrem em média, todos os meses, 400 pessoas devido a pneumonias de origem bacteriana. Desde o início da pandemia do covid-19 morreram 33 pessoas.” - isto é contextualizar. Poderia este serviço noticioso ir mais longe e informar que de momento não há um tratamento para a pneumonia provocada pelo covid-19, pelo que a melhor solução é o isolamento social. Notem que em vez de dizer que o covid-19 mata, dizer que ainda não há um tratamento seria muito mais produtivo. 
Por outro lado sabemos que a melhor forma de um grupo se tornar imune a um vírus é através da exposição ao mesmo. Isto deixa-nos numa situação periclitante. Por um lado ganhamos imunidade ao expormo-nos ao vírus, por outro lado não há tratamento e não sabemos quem reúne as condições físicas para superar o ataque viral. 

Aqui entra a parte da reflexão. Vamos ponderar, mantendo-nos isolados uns dos outros. E nesta ponderação poderemos descobrir muita matéria interessante. Deixo aqui apenas algumas das minhas descobertas feitas em isolamento nos últimos dias.

  1. Ao longo da história da humanidade houve muitas pandemias, esta é mais uma. As pessoas que adoram teorias de conspiração, por favor notem que esta pandemia não é uma novidade. Houve outras antes;
  2. Quando nos é diagnosticado um cancro, ou uma doença potencialmente fatal, o nosso organismo entra em modo de sobrevivência e utiliza todos os seus recursos para destruir a causa da doença. O Planeta Terra, enquanto organismo vivo, terá o mesmo comportamento;
  3. No presente, a humanidade, todos nós sem excepção, estamos a comportar-nos como um cancro, querendo mais e mais, nunca satisfeitos, não olhando a meios para atingir fins, e, de uma maneira geral, destruindo o nosso próprio habitat;
  4. O Planeta, enquanto organismo vivo, activou as suas defesas, neste caso através de um vírus a que chamamos covid-19. Pessoalmente considero golpe de génio. Basta observar a redução nos níveis de poluição, no tempo livre que de repente temos para repensar a nossa vida e decidir o que realmente é uma prioridade e importante, começarmos a dar importância às pequenas coisas que antes ignorávamos, e descobrimos que há muita coisa na nossa vida que é apenas excesso de bagagem;
  5. Somos obrigados a reflectir sobre a nossa mortalidade. Alguns de nós, levados na onda de pânico, falamos da morte como se fosse uma novidade. “Ah! Foda-se! Afinal sou mortal e a minha vida pode acabar a qualquer momento!” - A sério ?! Não sabiam disto? Cada dia que vivemos é um milagre. São tantas, mas tantas, as coisas que podem pôr um fim à nossa vida diariamente. Foi preciso um vírus para nos despertar para esta coisa da mortalidade;
  6. Ninguém quer morrer. Isto é um absoluto disparate. A única coisa que é garantida quando nascemos é precisamente a nossa morte. A nossa fragilidade. E se vivermos cada dia como sendo o último neste planeta? Talvez nos tornássemos pessoas melhores, mais atentos uns aos outros, mais colaborativos;
  7. Saber-me mortal, saber que este corpo pode não ter vida ao final do dia de hoje leva-me a ponderar acerca das minhas escolhas. Por exemplo, escolho não ir para a aldeia para junto dos pais, a ideia de os poder infectar é algo com o qual talvez não saiba lidar. Isto leva-me a pensar que participo no isolamento social não pelo medo de ser infectado ou morrer, mas pelo respeito à vida dos outros;
  8. Pessoalmente este corpo tem um sistema imunitário que de momento é bastante frágil. Isto leva-me a viver em paz cada dia sabendo que pode ser o último neste maravilhoso planeta. Leva-me a amar este corpo por manter-se vivo, só por hoje;
  9. A possibilidade de não estar vivo amanhã pode levar-nos a ser amáveis com os que nos rodeiam, a ser mais cuidadores, a esquecer as nossas birras infantis e a ser adultos que sabem mimar e cuidar e divertir-se também (se alguém tiver um Sancerre aí por casa que não precise, eu mando um Uber buscar);
  10. Enquanto espécie somos demasiados e o planeta não tem, no presente, recursos para sustentar a vida humana. Cada ser humano que morre é uma ajuda para a saúde do planeta. Esta é difícil de digerir, estou consciente disso. Por outro lado, e como pessoalmente estou em paz com a minha mortalidade, se tiver que ser um dos que deixa o planeta para que gerações futuras tenham uma vida melhor, que assim seja.

O problema das notícias é que não educam. Tentamos controlar as massas através do medo, como sempre se fez ao longo da história. E a história tem este hábito de se repetir até aprendermos. Talvez fosse possível controlar as massas sem a necessidade de as controlar, mas antes educando-as. A educação é fundamental. Tornámo-nos numa espécie tão perversa que pagamos mais a pessoas que nos entretém, desde jogadores da bola a actores de cinema, do que aqueles que realmente contribuem para o bem-estar da sociedade, como os professores e cientistas. 

Uma última reflexão, dirigida a todo o movimento de desenvolvimento pessoal e auto-ajuda que tem vindo a ganhar terreno. Esta é uma excelente oportunidade de aprender que frases feitas como “tu és capaz”, “nada é impossível”, “segue os teus sonhos”, são em realidade apelos ao consumismo desenfreado, a um desrespeito total pelos outros, a um egoísmo doentio em que não se considera a vida no seu todo. Seria mais saudável, como qualquer professor poderia explicar, que às vezes somos capazes e às vezes não somos. Por vezes conseguimos realizar os nossos sonhos, e por vezes não (e são mais as vezes em que não conseguimos). Aprender que acreditar que podemos controlar a vida é uma ilusão criada pela mente egóica e doente.

Por fim vamos olhar para a resolução das notícias, que não existe de momento. 
No caso do covid-19, seria excelente terminar qualquer notícia com informação acerca dos avanços que cientistas estão a fazer, como podemos reforçar o sistema imunitário. O nosso sistema de defesa pode ser fortalecido com alimentos, com boa disposição, alegria, anedotas, serenidade. Em vez disso, as notícias alimentam-nos com medo, pânico e ansiedade.

Há um quarto problema com as notícias, e que com a ajuda das redes sociais, se torna mesmo destrutivo. O excesso de informação. Somos bombardeados com muita, mesmo muita informação, desde o velhote na Suazilândia que matou os filhos até ao último disparate do presidente dos Estados Unidos. Como não processamos esta informação e nos limitamos a “engolir”, o nosso cérebro entra em modo de ansiedade e sobrevivência muito facilmente. O modo de sobrevivência por longos períodos de tempo inibe o sistema imunitário. 

Termino com o ditado oriental com o qual vivo há uns três anos.
“Sabendo tu que a tua morte é inevitável, e sabendo ainda que o dia da tua morte é desconhecido, o que realmente é importante hoje?”

Mimem-se.

Ciência e Pseudociência

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