Vamos
mergulhar na realidade dos relacionamentos íntimos entre dois adultos.
O
primeiro aspecto que aparentemente temos dificuldade em assumir perante o amor
da nossa vida é que queremos coisas do outro. Aquilo que chamamos amor é na
maior parte das vezes um jogo de interesses muito bem camuflado.
Eu
dou-te sexo, se tu me deres uma vida social. Eu dou-te uma vida social se tu me
deres atenção. Eu dou-te atenção se tu me deres segurança.
Mas
não temos a integridade nem maturidade de dizer ao outro o que queremos dele.
Esperamos que adivinhe. Da mesma forma, tampouco sabemos o que o outro quer de
nós. Então dedicamo-nos ambos ao jogo do adivinha. Eu fico à espera que
adivinhes o que eu quero de ti, e, por conseguinte, eu vou estar atento às tuas
pistas para adivinhar o que queres de mim.
Claro
que ambos iremos falhar. Isto porque a humanidade no seu todo adora duas
coisas: a novidade e a aventura (ok, muitos gostam de uma aventura cheia de
segurança e sem surpresas desagradáveis, o que é impossível). E ao procurar a
segurança na relação iremos perder ambos. Tornamo-nos controladores. Por vezes
de uma maneira subtil (“mandei-te um sms e demoraste trinta e cinco minutos a
responder, onde é que estavas?”), outras vezes de maneira hostil e obnóxia (“sei
que andas a meter conversa com outras gajas no Facebook, não sou estúpida,
percebes?!”).
Como
em realidade eu não te digo o que quero directamente, nem tu a mim, a relação
irá sofrer com esta atitude. Eu quero que me dês atenção, e quando estás colado
ao iPhone a jogar Pokémon Go eu amuo (“Pista! Presta atenção! Hello?! Então não
vês que quero que esqueças aquilo que gostas para te dedicares aquilo que eu
gosto, que basicamente é ter a tua atenção”).
De
maneira idêntica o outro quer sexo, embora tu estejas a mil à hora na tua
cabecinha a pensar no que irás vestir naquela festa fabulosa do próximo
fim-de-semana, e sexo é uma coisa que nem te passa pela cabeça. Então quando o
teu “mais-que-tudo” te acaricia a tua mente faz o filme do “então não vês que
não sou capaz de decidir entre o vestido justinho rosa choque Alexander Wang com
os sapatos Miu Miu, e o macacão Prada com as sandálias Brain Atwood?!”. E a carícia do companheiro torna-se a faca que golpeia a relação (neste caso a tua relação com a indumentária do fim-de-semana, percebes isto, não percebes?).
Como
ambos querem coisas diferentes, o que é absolutamente natural, mas nenhum tem a
coragem de o afirmar, excepto quando a loucura é tanta que desatam aos gritos e
insultos, a relação está condenada ao
fracasso desde o início.
Alguns
de nós, por motivos variados, optamos então por nos tornarmos subservientes e
dizer “sim” a tudo, incluindo a depressão que não sabemos porque se instala.
A
solução mais prática, e que não aprendemos, é nós próprios termos a capacidade
de nos dar aquilo que exigimos ao outro. Isto liberta o outro para ser quem é.
Sem a necessidade de um companheiro/namorado/marido, a vida torna-se doce,
suave, leve. E amorosa, que é o que pretendemos quando iniciamos um
relacionamento íntimo.
Depois,
para os mais requintados nesta arte de sofrer a dois, há a necessidade do
companheiro se tornar um paizinho, sempre disponível para lhe fazer as
vontades. Ou numa mãezinha, atenta a todas as suas necessidades. Mas isso é uma
outra história que podemos ler mais tarde.
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