Observo
como a grande maioria de livros de auto-ajuda, assim como workshops, retiros e
seminários, vendem a ideia de uma vida feliz. Uma vida feliz que é realizável,
bastando seguir uma qualquer fórmula. Desde o pensamento positivo à comunicação
com anjos e mestres ascencionados.
Em
primeiro lugar é interessante observar o que acontece a qualquer emoção
positiva, como a felicidade. Dissolve-se no tempo. Não é possível viver feliz o
tempo todo. Podemos ficar felizes com a promoção no trabalho, mas esta
felicidade durará apenas até ao aparecimento da próxima factura ou contractura
muscular. Claro que estes autores irão
imediatamente afirmar que se surge uma factura descomunal ou uma dor
insuportável isso é porque não estamos a comunicar honestamente connosco ou
noutra vida fomos uns bandidos ou o corpo está a dizer algo que não estamos a
ouvir. Pode ser verdade. Mas não pode ser “a verdade”, como se não houvesse
todo um conjunto de factores causadores do nosso mal-estar.
A
realidade é diferente de toda a felicidade que nos impingem. A realidade inclui
tudo, nada fica excluído. Há um beijo doce e que nos faz tremer, e há dores de
dentes. Há um passeio mágico num bosque da Toscana, e há a picada de uma vespa
no jardim próximo de casa. Há um sentimento de plenitude que surge depois de um
sucesso, e há uma depressão inquietante ao morrer alguém que nos é querido.
As
emoções negativas são em realidade bastante positivas. Enquanto que as emoções
positivas se diluem no tempo, as negativas permanecem e até se intensificam até
que a situação que provocou o seu aparecimento seja resolvida.
Podemos
sentir alegria ao saber que o nosso salário foi aumentado. Mas esta alegria irá
dissolver-se no tempo. Já o ressentimento sentido ao descobrir que o colega usou
o nosso trabalho para benefício próprio e sem o nosso consentimento irá
manter-se até que consigamos resolver esta situação.
E é
aqui que reside o perigo de muitas técnicas de auto-ajuda. Ensinam a ignorar o
mal-estar e focar a atenção no positivo. Naquilo que está bem. Só que aquilo
que está mal não irá desaparecer. Outras tentam eliminar as emoções negativas
através de técnicas . E a realidade é que estas emoções podem esconder-se, mas
enquanto a causa existir elas irão interferir no dia-a-dia.
Há
uma diferença descomunal entre estar em paz com a vida, com o que acontece, e
viver feliz. A pessoa continuamente feliz só o conseguirá através de um estado
profundo de negação ou com a ajuda de certas drogas (legais e/ou ilegais).
Poderia
respeitar-me o suficiente para permitir que a raiva, o medo, o ressentimento, a
mágoa, a dor, tenham a possibilidade de se viver através de mim? E saber que
cada uma destas emoções é um mestre que nos oferece algo para aprender.
Vender
felicidade é um bom negócio durante algum tempo. Eventualmente poderemos
descobrir que é impossível ser-se sempre feliz. Porque a felicidade implica que
determinadas condições sejam atingidas. Como ter a casa perfeita, o companheiro
perfeito, o trabalho perfeito, e, eventualmente, viver num mundo perfeito. E
tal não é possível. O mundo é perfeito mas não da forma que nos foi ensinado.
Já
estar em paz com a vida, ser um observador activo e mudar o que quer que seja
que peça mudança, exige maturidade.
Parabéns, é uma chamada de atenção que não se costuma encontrar 'por aí'. Abraço
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