Cérebro 2.0


O nosso cérebro, de uma maneira geral, é o responsável por manter-nos vivos. A sua única função é evitar a morte e o sofrimento. Para cumprir isto encarrega-se dos eventos em todo o corpo e vida. Desde o ar que entra nos pulmões até aquela sobremesa extra que sabíamos que não era para comer.

Há toda uma melodia a ser tocada no nosso corpo cujas notas são os neurotransmissores. Demasiada adrenalina e o coração dispara. Pouca ocitocina e sentimo-nos uns desgraçados. Muita luz solar e ficamos activos, pouca água e apodera-se de nós uma ansiedade. 

Mas todas estas emoções são o cérebro a fazer o seu trabalho para nos manter vivos. Elementos externos, como a luz, os alimentos, os relacionamentos e trabalho, provocam a produção ou inibição de químicos e/ou  sinais eléctricos que por sua vez resultam em estados emocionais.

E é aqui que encontramos muitos dos nossos dramas de hoje. O cérebro continuamente processa informação exterior para saber o que fazer. E o que é para fazer é simples: manter o corpinho vivo. Até há poucos anos a grande maioria das pessoas ocupava a mente pensante com problemas a sério. Organizar a casa, trabalhar para ter comida e roupa, estudar para ter casa, ser simpático para poder procriar.

Nos nossos dias esses problemas praticamente não existem nos países ocidentais. Poucas pessoas têm que efectivamente preocupar-se com a próxima refeição (mesmo um sem-abrigo tem organizações a fornecer refeições gratuitamente). Mas a mente não sabe ficar sossegada. Obedece a uma ordem ancestral implantada no nosso cérebro reptiliano: mantém-te vivo. 

Obedecer a esta ordem implica procurar problemas para resolver. Porque resolver problemas é o que o cérebro gosta de fazer, ou pelo menos está programado para isso. 
E que problemas temos hoje que impeçam estarmos vivos? Zero! Nada! Rien! Zilch! 

Então, a mente, que não sossega, inventa problemas. Preciso de um telemóvel novo com ecrã  de 20 polegadas, som Dolby 7.0, e reconhecimento genital. Preciso de ir de férias para aquela ilha a sul da Nova Zelândia. Tenho que convencer os colegas de trabalho que o meu sentido de moda é o melhor. Se não conseguir parceiro antes dos 16 anos é porque há algo de errado comigo. Se a minha parceira terminar a relação não saberei o que fazer à minha vida. Há crianças a morrer à fome num país qualquer ali ao lado daquele país qualquer. O plástico está a destruir o planeta e tenho que que me revoltar com esta sociedade.

Transformar estas situações em questões de sobrevivência é estúpido. E é o que a mente faz, na sua loucura. 

Pouco a pouco estamos a destruir o ser humano animal, o que procura comida, refugio, sexo, e a querer criar um ser humano ideal, perfeito, sempre feliz. Isto é a causa de muito mal-estar emocional. No fundo, se pararmos, sabemos que aquilo que nos atormenta muitas vezes não tem qualquer implicação real na nossa vida enquanto seres vivos. 

Pessoas entram e saem das nossas vidas. É natural. Coisas entram e saem das nossas vidas. E também é natural. Querer que a vida seja como nós queremos é um movimento fútil de pura arrogância. A vida está-se nas tintas para os nossos quereres. Vive-se. Ponto final. 

Então, como podemos nós parar esta tendência para a loucura da nossa mente? 

Abrandando. Mais devagar. Dedicarmo-nos ao que realmente é importante. O que comemos, com quem estamos, o que fazemos. Brincar. Trabalhar. Socializar. Sem expectativas. 
Aprender a sermos directos com os outros, em vez de tentar subtilezas e indirectas. Dizer sim quando é sim que queremos dizer. E não, quando queremos dizer não. Não esperar que os outros adivinhem o que vai nas nossas cabecinhas loucas. Aprender com as situações difíceis (são muito, muito poucas, mesmo!). 

O parceiro que sai da relação não significa o fim da vida. O fémur fracturado não significa que vai haver pestilência ou fome a devastar o planeta. O trânsito parado não significa a queda de um asteróide a aniquilar a vida tal como a conhecemos. 

Alterar os processos dementes da mente é relativamente simples. Em cada situação aprende algo, descobre a bondade da vida, ou questiona-te sobre o significado que estás a atribuir à situação. Em vez de querer controlar a vida (iremos falhar), experimenta permitir que a vida se viva em ti. Dá as boas-vindas a qualquer emoção e permite que se viva em ti completamente. Não te agarres ao pesadelo de querer destruir o que está presente. Nada é para sempre, nada é constante. Tudo muda. Incluindo a tristeza, mágoa ou euforia. A vida é movimento. E o cérebro sabe-o.

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